Ao
abordar sobre cultura brasileira, podemos perceber que o Paraná se fixou no
cenário nacional e até regional sem uma tradição de sua identidade. Porém, isso
não significa que não possua. Sendo assim, é fundamental para os paranaenses o
conhecimento da cultura legitima e pura do nosso estado: o fandango. Apesar de
sua simplicidade, esses mantém uma estrutura poética e rítmica, que o
diferencia do fandango de outros estados.
No
Brasil, o fandango possui significados
distintos, dependendo da região. Em alguns estados do norte e nordeste, é chamado
de bailado dos marujos e marujadas, chegança dos marujos ou barca. Na região sul, a partir de São Paulo até o Rio
Grande do Sul, é considerado um conjunto de danças rurais, composto de diversas
coreografias. Enquanto no norte e nordeste não há um enredo lógico, sendo uma
série de cantigas náuticas de várias origens, na região sul o descobrimos como
festa/ baile. Em São Paulo é uma dança como o cateretê, outras vezes é sinônimo
da chula. Como baile ou dança, pode ser tanto
individual quanto de par, não sendo conhecida no norte de nosso país. Segundo Novack
(2005 p19), há afirmações de que no
Brasil existem duas modalidades de fandango, o do litoral, onde são usados tamancos
para se dançar em um tablado de madeira, e o tropeiro, onde botas são
utilizadas.
Embora
o Paraná seja considerado um estado pobre em danças folclóricas, o fandango
paranaense É rico em canções e ritmos, sendo uma reunião de diversas danças
(marcas). Sua coreografia é difícil, exigindo de quem a executa técnica, dedicação,
desenvoltura e preparo. Além disso, existe a necessidade de calçado adequado
para o sapateado masculino: os tamancos.
Apesar de muitos estudos registraremos fandango como expressão cultural de
origem estritamente ibérica, para o historiador e professor Magnus Pereira, da
UFPR isso é equivocado. Segundo ele, estudiosos da cultura européia localizaram
a procedência do fandango na América latina. Em seu livro semeando... irás rumo ao progresso, ele faz referência ao
historiador Peter Burk, o qual escreveu que o fandango veio da América para a
Espanha por volta de 1700.
Empregando esse raciocínio, o fandango
paranaense veio com os ibéricos, e teve sua origem na América Latina, sendo levado
para Europa, onde se desenvolveu, retornando para algumas regiões brasileiras.
Porém,
Bittar (2008 p 18) nos chama atenção para dificuldades dos pesquisadores que se
propõe a buscar as raízes dessa dança, tendo em vista que para alguns, o
fandango possui mais de 1000 anos de existência, sendo uma herança fenícia.
Outros apontam a Índia, sendo o Brasil seu país de origem. Há ainda quem encare
sua procedência vinda das Filipinas. As diversidades dessas teorias dificultam
a constatação referente à idade e procedência do fandango.
No Paraná, essa é uma festa típica de caboclos e pescadores, habitantes
da faixa litorânea do estado, onde várias danças regionais denominadas “marca
de fandango” são executadas. Segundo Azevedo (1978, p3)
Temos Registrado perto de
trinta marcas diferentes, e muitas outras existem ainda, próprias de cada
região que se dança o fandango. As que temos anotado são as seguintes: Anu,
Xarazinho, Xará Grande, Queromana, Tonta, Dondom, Chamarrita, Andorinha, Cana
verde, Marinheiro, Caranguejo, Vilão de Fita, Meia Canja, Chico, Tiraninha,
Lageana, Passeado, feliz, Serrana, Sabiá, Recortado, Caradura, Sapo, Tatu, Porca,
Estrala, Pipoca, Mangelicão, Coqueiro, Pega fogo e outras, umas conhecidas em
certas zonas e outras, noutras.
Segundo Novak no período do Brasil Império o fandango era desprestigiado
e proibido por ordens Reais. Também sofreu censuras eclesiásticas, sendo
considerada uma heresia. Essa autora
ainda nos relata que nessa época, todos os municípios paranaenses colocaram
obstáculos referentes ao fandango e ao batuque, pois eram rotuladas como danças
lascivas, onde se realizavam movimentos dos quadris considerados provocações
sexuais. Isso era visto como ofensa aos puritanos, classe dominante do período.
Segundo a mesma autora, vereadores-fazendeiros demonstraram sua indignação
contra o fandango criando leis onde a prática dessa dança era restrita a casos
específicos. Ela nos esclarece que no artigo 2º dessa lei (Novak 2005, p31).
Ficam
proibidos os batuques ou fandangos ainda mesmo que fora das povoações, sem
licença dos Juiz de Paz respectivo, que só poderá conceder a pessoa de
reconhecida probabilidade e por ocasião de casamento: o dono da casa que
consentir a introdução de filhos de famílias e escravos sem consentimento de
seus pais ou Senhores, sofrerá a multa de 5 a 10$000 réis: a mesma pena que
ficam sujeitos os que fizerem tais divertimentos sem a licença acima declarada.
Curitiba,
6 de Fevereiro de 1893.
O fandango permaneceu proibido tanto no
meio rural quanto no urbano até 1860. Após essa data, teve uma alteração
expressiva na lei: de um “é proibido”, para um ‘é permitido. Porém essa autorização
anda era concedida através de autoridade policial. Somente em 1900 houve um projeto de resgate
do fandango, através de Rocha Pombo e Júlio Perneta, fato que foi bem sucedido
em algumas regiões. Segundo o professor Pereira (1996, p 217), no Paraná não
houve a construção desta tradição por “falta de vontade política.”.
Atualmente,
o interesse pelo fandango tem se restaurado. Diversos grupos, formados
especialmente por jovens habitantes do litoral paranaense (chamados caiçaras)
vêm recuperando a memória deste que é um dos mais tradicionais elementos da
cultura brasileira.
Na tradição do fandango, os dançarinos
são denominados “folgadores”, e as dançarinas, “folgadeiras”. Os folgadores utilizam tamancos especiais, o
que pode ser considerado uma espécie de objeto sonoro, pois devem seguir os
acompanhamentos de violas e adulfes. Segundo Pinto (2006 p 99) A viola
utilizada no fandango é fabricada nas ilhas Paranaenses, possui onze cordas, e
não há métodos de afinação, geralmente são “temperadas”. Há também a “rebeca,
ou rabeca”. São confeccionadas através de caxeta, cedro ou caroba. Possui três
ou quatro cordas de aço, afinadas nas quitas justas mi, ré, sol. Seu arco é
feito de canela ou pitangueira e cordas de timbopeva. O adulfe é confeccionado
a partir de caxeta, e as “baterias”, de tampinhas de garrafas amassadas. É
coberto com couro de cotia. Esses instrumentos eram fabricados pelos pescadores
e caboclos, inclusive o tamanco. Atualmente, devido à falta de matéria prima e
as leis do meio ambiente, são confeccionados em outros lugares. A casa do fandango é uma construção única, pois
as danças realizavam-se em recinto fechado, sendo que o assoalho precisa estar
a 2 metros do solo (um buraco é feito embaixo do assoalho com 2 metros de
profundidade e 3 de diâmetro) A função das folgadeiras no fandango se reume a
valsear. Antigamente isso as limitava a somente arrastar os pés, atentas a
evolução, sem oferecer nenhuma expressão. Hoje, porém, a mulher (ou folgadeira)
participa ativamente, mexendo o corpo e por vezes fazendo a saia rodar, com
graça e feminilidade. A folgadeira que antigamente rejeitava uma dança estava
fazendo “desfeita”, portanto não poderia haver recusa. Quanto ao folgador, (ou
fandangueiro), aquele que através do sapateado consegue quebrar o assoalho
recebe o nome de machado. Porém aquele que erra o sapateado faz “balaio”, o que
era considerado uma vergonha antigamente. Outro aspecto interessante: quem
canta, ou toca algum instrumento não dança, mas às vezes o violeiro deixa seu
instrumento para bater palmas. A festa
do fandango durava muitas horas, iniciando ao anoitecer e terminando ao amanhecer.
Além das festas, antigamente, costumava-se
fazer os pichiruns, também chamados de pexirão ou mutirão. Era uma maneira
alternativa de se realizar as tarefas agrícolas sem precisar fazer grandes
investimentos, obtendo assim alimentos para consumo próprio ou troca. Ao
terminar o trabalho, o dono da colheita, em agradecimento aos participantes voluntários,
sacrificava uma res, para fazer o Barreado, prato inseparável do fandango. Esse
era diferente do entrudo (carnaval): quatro dias em que o litorâneo não fazia
outra coisa, a não ser bater fandango e comer barreado. Entrudo é o nome dado
antigamente ao carnaval. Esse termo vem do latim introitus. Significa início, ou seja, começo da entrada da Quaresma.
Em vista disso, não há como separar
esses dois aspectos: fandango e barreado. Por ser um prato que pode ser
requentado várias vezes sem perder o sabor original, folgadores e folgadeiras o
preparavam no dia anterior ao fandango. Durante várias horas os ingredientes
eram fervidos em uma panela de barro vedada com folha de bananeira pirão de farinha
de mandioca, cinza e água. As bebidas consumidas durante o baile são a cachaça
da região e cerveja, além do quentão. Esse, porém é tomada fria pelos dançarinos.
Na ilha dos Valadares encontram-se atualmente
três grupos de fandango: Grupo
Folclórico Mestre Romão - formado desde 1994. Constituído
para divulgar a dança do fandango pelo Brasil afora. Participa de diversos
festivais nacionais e internacionais de danças folclóricas, além de inúmeras
apresentações ao público em solenidades preparadas. Os músicos e cantadores são
moradores antigos da ilha que aprenderam o fandango com seus antepassados. Os
dançarinos são jovens estudantes moradores de Paranaguá. Recebem incentivos da
Prefeitura municipal de Paranaguá. Grupo
de fandango mestre Eugênio: Fundado por Eugênio dos Santos, é constituído
de adultos e jovens da Ilha dos Valadares. Possuem uma casa de fandango que
ficou pronta em 2003, com palco para tocadores e cantores, além de assoalho de
madeira para os dançarinos. Grupo de
fandango Caiçara: Composto apenas por jovens está em busca de fama e dinheiro. A
música é mecânica, pois eles não cantam nem tocam instrumentos. Sobrevivem com
recursos próprios e treinam para apresentar o fandango show.
Enfim, essa manifestação é muito rica,
infelizmente, não é divulgada. Sendo assim, como citado no início, o Paraná
permanece no cenário brasileiro sem uma identidade cultural. Porém isso somente
será mudado através de uma conscientização e divulgação de como a nossa cultura
é importante e rica, além de estar interligada com diversos fatos históricos do
nosso país.
REFERÊNCIAS
AZEVEDO, Fernando Corrêa de. Fandango do
Paraná. Rio de Janeiro. Ministério da
Educação e Cultura. 1978
BITTAR, Nazir; BRITO, Maria de Lourdes da Silva; RANDON, José Augusto Ganba. Fandango de
Mutirão. Curitiba, Bof, 2003
PINTO, Inami Custódio. FOLCORE NO PARANÁ.
Curitiba. SesquiCentenário. 2006
PEREIRA, Magnus Roberto de Mello. Semeando
iras rumo ao progresso. Curitiba: Ed. UFPR, 1996.
FANDANGO DO PARANÁ. Disponível em http://www.curitibacultura.com.br,
acesso em 8/01/2014.
IINSTRUMENTOS DO FANDANGO: disponível em http://globotv.globo.com acesso em
13/01/2014
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